Um dia, em um momento de iluminação extrema, talvez eu descubra o que me fez ser tão inadequada. Sim, inadequada. Incapaz de vestir a adequação como se fosse uma roupa da moda. Eu simplesmente nunca soube. E nunca soube como é que as outras pessoas sempre pareciam saber. Quem revela o segredo? Quem dá a partida? É um mistério.
Rose is a rose is a rose is a rose
Loveliness extreme.
Extra gaiters,
Loveliness extreme.
Sweetest ice-cream.
Pages ages page ages page ages.
Para mim, uma bolsa é uma bolsa. Assim como a rosa que é uma rosa é uma rosa é uma rosa da poeta norte-americana Gertrude Stein. Uma bolsa vale pelo seu espaço interno. Pelas suas divisórias e pela quantidade de zíperes (zíperes são úteis, gente!). Vale também pela alça confortável, que se aninha perfeitamente no ombro. Porque, assim como uma atriz famosa que não me lembro mais quem era disse uma vez, não nasci para dobrar o braço e carregar elegantemente uma bolsa de mão.
Uma bolsa é uma companhia de longo prazo. Mudar de bolsa de acordo com o look é um perigo. A carteira sempre se perde na transição. Ou o porta-moedas. Ou aquele papelzinho onde você anotou um telefone que só vai ser útil quando o papelzinho sumir. Essas coisas. Muito mais seguro se agarrar à mesma bolsa até enjoar dela.
Porque, por mais utilitária e bem dividida que ela seja, a bolsa também enjoa. Sou inadequada, sim, mas sou humana. Mas estou perdendo o foco. A conversa aqui é outra.
É sobre não entender a lógica das tendências e não conseguir seguir as mesmas paixões momentâneas das maiorias. Se a bolsa não se encaixa na minha rotina, ela não me atrai. O que dizer então dos sapatos sem um pingo de conforto, que hordas femininas usam, em sofrimento, para demonstrar conhecer os segredos da sedução e elegância daquele exato momento histórico? Não compreendo.
O mais curioso é que essa informação obscura sempre circulou entre as pessoas – não, isso não é uma exclusividade da mulher – descoladas. Isso já acontecia antes do advento das blogueiras. Talvez já acontecesse antes da invenção dos tipos móveis. As pessoas adequadas simplesmente sabem o que usar. Fazem bonito. São admiradas. Para elas, uma bolsa pode ser um código de validação social. Que todos compreendem.
O que me consola é estar em boa companhia. Pessoas inadequadas sempre quebraram padrões e questionaram certezas sociais. Essas chacoalhadas têm sido responsáveis por revoluções, evoluções, rupturas e novos comportamentos que colocam a vida e a sociedade para rebolar.
Inadequados são palhaços, são artistas, são os que causam espanto e os que questionam. Inadequados, quando geniais (e que fique claro que a maioria está longe disso), ficam na História. Subvertem a História. Reescrevem os significados das palavras. Transformam pensamentos. Inadequados são meus heróis e meus ídolos. São a minha voz, mesmo que eu nunca tenha percebido isso.
Agarrada na minha bolsa, perfeita para mim, percebo que me pego sorrindo, vingativa: os adequados não mudam o mundo.
Claudia Bia – jornalista inadequada