Guerra Mundial e as parteiras brusquenses
Em dezembro de 1917, a Primeira Guerra Mundial ainda duraria mais um ano de doença, sofrimento, fome e morte. E a nossa Gazeta Brusquense continuava enchendo suas páginas com notícias e propaganda de guerra favoráveis às nações do Eixo. Apesar de se proclamar um órgão de imprensa “independente”, o jornal defendia as ideias do pangermanismo […]
Em dezembro de 1917, a Primeira Guerra Mundial ainda duraria mais um ano de doença, sofrimento, fome e morte. E a nossa Gazeta Brusquense continuava enchendo suas páginas com notícias e propaganda de guerra favoráveis às nações do Eixo. Apesar de se proclamar um órgão de imprensa “independente”, o jornal defendia as ideias do pangermanismo e apoiava abertamente a Alemanha contra os países aliados. Assim, a principal matéria da edição do dia 19 daquele mês, transcrevia uma entrevista do marechal Paul von Hinderburg, comandante do exército alemão.
Dizia ele que seu país sempre tinha desejado a paz e que, naquele momento do conflito, cabia “aos inimigos” irem até os alemães para se sentar à mesa e falar sobre a paz. Após três anos de guerra e com os Estados Unidos já combatendo ao lado das nações aliadas, o marechal devia saber que a derrota alemã era inevitável, uma questão só de tempo. Porém, sabia também que guerra não é somente conflito com armas e bombas que ferem e matam nos campos de batalha.
É informação para vender o discurso do otimismo e alimentar a esperança do povo que não deve perder a crença na vitória do seu exército. É, também, propaganda para manter a moral elevada da soldadesca, que precisa de coragem diante do tenebroso dilema de matar ou morrer ao enfrentar o fogo vomitado por fuzis e canhões do inimigo. Assim, Hinderburg não podia falar em derrota do “grande” império alemão e propagandeou aos jornalistas de Viena: “não devemos pensar na conclusão da guerra, a menos que não sejamos os victoriosos”.
Diversas outras notícias sobre guerra, enaltecendo a campanha militar alemã, ocuparam boa parte das páginas da Gazeta. Mas, no final da segunda página, entre as poucas notícias locais, um curioso aviso do dr. Mário Kroeff, delegado de saúde do município. Parecia mais uma advertência dirigida às parteiras da cidade. Alertava que, “em casos complicados de partos e para os quais não estivessem habilitadas”, as parteiras deveriam chamar logo um médico. No caso de morte da parturiente, o que não era raro naquela época, o médico comunicava que iria apurar se a parteira tinha agido com descuido ou imperícia, a fim de responsabilizá-la criminalmente.
Médico, poucos podiam pagar. SUS nem em sonho passava pela cabeça das pessoas. Assim, conhecidas e respeitadas por seu trabalho, aquelas mulheres é que faziam a grande maioria dos partos em Brusque. O dr. Kroeff, no entanto, não queria ser acusado de estar agindo por “interesse do vil dinheiro”. Em seu aviso, informou que estava disposto a fazer um trabalho filantrópico: “aos pobres sempre atendi e atenderei de graça”.
Aos poucos, as parteiras cederam lugar aos médicos. Mas, durantes anos ainda, essas obstetras sem diploma eram retiradas do aconchego dos seus lares por pais angustiados. Sempre estiveram prontas para exercer a nobre missão de assistir mães aos gritos pela dor do parto e dar a preciosa ajuda no mágico momento do primeiro impulso para a vida. Viveram para ajudar o fruto do ventre alheio a deixar o casulo maternal, no momento de encontrar o misterioso e extraordinário caminho do mundo da luz e da vida.