Conversas Praianas: Tribos de Veranistas
Carnaval no passado, março caminhando para a quinzena final, já não são mais tantos veranistas tomando banho ou sentados embaixo dos tradicionais guarda-sóis ou das barracas de lona, esse novo oásis à beira-mar, a garantir sombra e água fresca para a família inteira e agregados, a deleitar-se com a brisa marinha, que nem sempre bate […]
Carnaval no passado, março caminhando para a quinzena final, já não são mais tantos veranistas tomando banho ou sentados embaixo dos tradicionais guarda-sóis ou das barracas de lona, esse novo oásis à beira-mar, a garantir sombra e água fresca para a família inteira e agregados, a deleitar-se com a brisa marinha, que nem sempre bate ponto para arrefecer o calor dos finais de manhã e das tardes escaldantes de verão.
Até o carnaval, eram muitos os veranistas que se espremiam para fincar barraca o mais perto possível da fronteira marinha riscada pelo vaivém das ondas do Atlântico. Quais nômades, essa gente vem de longe para formar uma autêntica tribo litorânea da ociosidade, onde tupis-guaranis e seus irmãos de sangue ameríndio ainda não garantiram o seu lugar ao sol, nesta sociedade de oceânicas contradições sociais.
Com o olhar de curiosidade do caminhante sem pressa para chegar, observei que a paisagem humana à sombra da vasta floresta de lona indicava que grande parte dessas tribos de arribação estival era gente do Centro-Oeste, o nosso eldorado da produção de grãos a fazer a riqueza de muitos que, até ontem, trabalhavam duro para ganhar o pão de cada dia. Bastava parar um instante e escutar o sotaque desses turistas ou os acordes da música sertaneja a 100 decibéis, num duelo renhido com o marulhar incessante das ondas se espraiando até quase os pés desses turistas a esbanjar alegria e prazer alimentada pela força do agronegócio.
Agora, a paisagem humana é diferente. Mas, não é novidade porque o Brasil só acorda depois do carnaval. E o mês de março sempre foi a temporada preferida dos turistas da terceira idade, muitos já no quarto tempo porque a velhice viaja cada vez mais, na medida exata do avanço da ciência médica. É um turismo grupal, o ônibus com uma carga de dois mil anos de idade e toneladas de experiência de vida, a maioria mulher porque o homem continua vencendo a fatídica maratona em direção ao juízo final.
Sim, a praia das águas de março é uma praia de cabeças brancas, muitas disfarçadas por uma caprichosa tintura acastanhada, acaju ou até um preto esmaecido para não chamar muita atenção ou não desbotar sob uma inesperada chuva. Também alugam guarda-sóis e barracas, estas agora as preferidas porque economizar é preciso. Afinal, esses são veranistas que chegam com dinheiro contado e três ou quatro barracas abrigam a lotação do ônibus.
Março não é temporada só de brasileiros aposentados. Sempre foi também o tempo de veraneio de los hermanos argentinos, que andam sumidos por causa da crise que anda braba pelas bandas portenhas. Reclamam da crise, mas teimam em eleger governos peronistas. Não são muitos, como acontecia no final do século passado.
Mesmo assim, caminhando pelas areias da Dubai brasileira pode-se ouvir muita conversa em espanhol. É claro que uruguaios e chilenos também fazem parte dessa tribo de veranistas de fala hispânica. E, pela pequena cuia do tererê, paraguaios também estão presentes, para ajudar as grandes empresas da construção civil a justificar o lema: Para cima, para o Alto, o Céu é o Limite.