João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - joaojoseleal@omunicipio.com.br

Conversas Praianas: Smith Wesson

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - joaojoseleal@omunicipio.com.br

Conversas Praianas: Smith Wesson

João José Leal

A condômina Maria Tereza, que o coronavírus botou na UTI por quase um mês e que escapou por pouco, acha que ficou completamente imunizada. Sente-se cheia de saúde. Não quer admitir que ficou diferente. Antes, mais ouvia do que falava. Agora, está sempre a falar, contando alguma fofoca sobre alguém do grande condomínio. Parece que essa é mais uma das sequelas deixadas pela Covid, ainda não pesquisada. Dessa vez, está falando do novo condômino.

— Ontem, cumprimentei o novo morador do 1508, no elevador. Ele fez de conta que nunca tinha me visto. Nunca fomos amigos, é verdade. Mas, eu vi muitas vezes essa figura na avenida Getúlio Vargas, em Chapecó. Era bastante conhecido por causa do nome Smith Wesson.

— É o sobrenome ou o apelido dele?

— Nada disso. São os dois prenomes, mesmo. O sobrenome é Spadollini, família bem conhecida na Capital do Oeste. Lá, todos conhecem a história. Foi capricho do pai, homem rico, proprietário de fazendas de pinhais em Faxinal dos Guedes, que já foi um distrito do velho município de Chapecó. Era uma terra de ninguém, uma vasta região de campo cheia de pinheiro araucária, disputada a tiros de revólver por madeireiros sem compromisso com a lei nem com a justiça.

— Lá pelos anos de 1940, a extração e o corte de madeira eram fonte de renda fácil. Era quem mais pudesse chegar, se apossar de terras sem escritura, montar um galpão com serraria, contratar peões sem direitos trabalhistas e mandar passar o machado ou a motosserra nos pinhais. Em poucos anos, a intensa atividade meramente extrativista acabou com as matas de araucária.

— O pai do nosso novo condômino foi um dos madeireiros pioneiros daquela região. Enriqueceu cortando, serrando pinheiro e exportando grande parte da madeira para a Argentina. Quando morreu, as fazendas e serrarias passaram para as mãos do filho que, no ano passado e agora veio morar aqui no Alvorada do Atlântico.

— Desculpa, Maria Tereza, mas nós queremos saber o porquê do nome Schmitt Wesson? Pelo que sei, é a marca de uma famosa marca de revólver.

— Pois é, amigas. O pai dele era pessoa temida em Chapecó, pela ambição e violência. Carregava sempre um revólver Smith Wesson ostensivamente portado na cintura. Corria na cidade o comentário de que, nas disputas pela posse de terras e pinheiros, havia matado três madeireiros. Isso, lá pelos anos de 1950, quando a justiça era praticada com as próprias mãos e os conflitos de terra resolvidos à bala. Nas bodegas da cidade, o velho caudilho sempre fez questão de dizer que o seu vasto patrimônio havia sido conquistado de arma na mão, ameaçando concorrentes e intimidando peões.

— O velho tinha feito uma promessa de dar ao seu primeiro filho, se macho fosse, o nome Smith Wesson. Queria homenagear a principal ferramenta usada para construir a sua riqueza.

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