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Conversas Praianas – A Ceia de Natal

Com seus mais de 70 anos e avó, Maria Francesca, gaúcha nascida em Passo Fundo, há muitos anos vive na capital do Oeste catarinense e se considera uma chapecoense da gema. Mais velha da tribo do Mares do Atlântico, essas mulheres que já cumpriram a missão maternal, algumas delas até conjugal, Maria Francesca é a […]

Com seus mais de 70 anos e avó, Maria Francesca, gaúcha nascida em Passo Fundo, há muitos anos vive na capital do Oeste catarinense e se considera uma chapecoense da gema. Mais velha da tribo do Mares do Atlântico, essas mulheres que já cumpriram a missão maternal, algumas delas até conjugal, Maria Francesca é a primeira a se servir do mate amargo e se sente no direito de começar a tertúlia vespertina.

E logo vai dizendo que, por causa da Covid, os filhos e netos não virão passar este Natal na praia. Por causa do coronavírus, tinham resolvido ficar em Chapecó, para evitar o perigo de contágio.

– Olha, Deus me perdoe o que vou dizer, pode parecer pecado. Mas, graças à pandemia o Natal deste ano será tranquilo. Amanhã, vou preparar um jantar bem simples para mim e o meu marido Serafino. Será bem mais sossegado, sem brigas nem desaforos, bem como deve ser uma noite de Natal. Um momento de paz, de meditação e, para quem é cristão, de oração. No ano passado, no nosso apartamento de Chapecó, foi uma noite constrangedora, triste e de chorar.

– Imaginem vocês! A família estava reunida – eu e o Serafino, minhas filhas Maria Isabel, divorciada e Angelita, com seu marido Nicolau. Estavam, também, três dos meus netos, para a ceia de Natal. Meu filho, que também está divorciado, foi passar a festa natalina com a sua namorada, em Maravilha. Faltava minha neta, enfermeira em Xanxerê, que chegou sem cumprimentar ninguém.

– Parecia contrariada. Mal desejou “Feliz Natal” para nós, foi ao encontro do avô, diabético e lhe deu uma caixa de bombons da Garoto, dessas que se vê empilhadas em qualquer mercadinho. Dar chocolate para um diabético! Não sei como pode ser enfermeira! Da mesma forma como chegou, saiu porta a fora, dizendo que ia se encontrar com o namorado, que nem sabemos quem é.

– Quando fui reclamar da ingratidão de uma neta, que fez a faculdade por nossa conta, meu insuportável genro gritou que não falasse mal da sua filha. E também se mandou porta a fora. Acho que ele não queria mesmo passar a noite de Natal conosco e aproveitou o barraco armado. Minha filha ficou desolada, não sabia o que dizer. Meu marido, que já andava deprimido, ficou sentado à mesa, sem nada dizer sobre a tenebrosa cena da noite natalina.

– Quase não consegui comer, de tão abalada que fiquei. Mal terminamos a triste ceia natalina, minhas filhas e os netos se retiraram. Logo fui para a cama e precisei de um calmante para dormir. E, assim, foi a nossa noite de Natal do ano passado.

– Então, lembrei-me, com tristeza, da minha infância e daqueles natais na colônia, em Passo Fundo. Na mesa, toda a família reunida, meus pais, sete filhos e duas ou três galinhas assadas, um pernil de porco, mandioca cozida e polenta para alimentar e satisfazer o apetite das numerosas bocas. Mas, ninguém reclamava, todos respeitavam pai e mãe e tinham a maior consideração para com os avós, já velhos e doentes.