João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - joaojoseleal@omunicipio.com.br

Conversas de consultório: a setentona

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - joaojoseleal@omunicipio.com.br

Conversas de consultório: a setentona

João José Leal

Já passava das seis da tarde. Numa conversa animada com a secretária, a última paciente não estava preocupada com o atraso do cardiologista. Sempre atenciosas, essas profissionais dos consultórios médicos atendem o telefone, marcam horários das consultas e, presencialmente, recebem os clientes de forma gentil. Se o médico atrasa, ouvem pacientemente o impaciente paciente e se transformam num escudo para livrar a barra do seu impontual chefe.

— Dona Gertrudes, o que a senhora fez para se conservar assim, bonita e elegante, aos 72 anos? A senhora parece não ter mais de 60. Não lhe tinha dito antes. Mas, cada vez que a senhora vem aqui, fico admirando a sua elegância. Depois, falo para outras pacientes que lhe conhecem. Todas concordam que a senhora é um exemplo de mulher bem conservada.

— Uma delas disse-me que lhe conhece há muitos anos e que senhora continua a mesma, sempre elegante e charmosa. Olha, eu já disse para as minhas amigas e até para o meu marido que, quando envelhecer, quero ficar como a dona Gertrudes.

— Pois é minha filha, já me perguntaram qual é a receita usada para me manter assim, com uma boa aparência física e disposição para viver. Sempre respondo que, se receita existe, desconheço e quero comprá-la. Para a minha idade, sinto-me bem e tenho boa saúde. Claro que não deixo de ir ao médico de vez em quando, como venho aqui para ver como está o coração. Mas, são consultas de rotina.

— Antigamente, a gente só ia ao médico quando estava passando mal, pronta para ser levada ao hospital, quase à beira da morte. Mas, sabes como é essa tal de modernidade. A gente chega aos 60 e começa a rotineira peregrinação aos consultórios médicos. Felizmente, tenho Unimed. Se dependesse do SUS, você sabe como é, a gente fica mais doente só em saber o tamanho da fila de espera para uma consulta. Se precisar de uma cirurgia especializada, então corre-se o risco de morrer antes de entrar no bisturi.

— Tomo dois ou três remédios porque se você vai ao médico não escapa de uma receita nem das farmácias. Esses profissionais modernos não querem saber quem a gente é, se trabalha, o que faz na vida, onde nasceu nem se a gente tem família. Perguntam o que a paciente sente e mais nada. Viram-se para o computador e começam a digitar um rosário de exames. É laboratório, é raio-x, que está caindo de moda. Agora, a moda é tomografia, ressonância e essa tal de medicina nuclear. Felizmente, até agora não encontraram nenhuma doença para mim.

— A verdade é que sempre me cuidei. Minha receita para manter a forma é comer pouco, caminhar bastante, trabalhar sempre que possível, em casa e no jardim. Não preciso ir ao médico para fazer dieta alimentar. Basta fechar a boca.

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