Inclusão: aluna com autismo inicia palestras para levar informação sobre o tema a outras crianças em Brusque

Julia Erbs mostra detalhes do TEA, da convivência e situações que devem ser evitadas para o autista não entrar em crise

Inclusão: aluna com autismo inicia palestras para levar informação sobre o tema a outras crianças em Brusque

Julia Erbs mostra detalhes do TEA, da convivência e situações que devem ser evitadas para o autista não entrar em crise

Em busca da inclusão, a aluna de uma escola de Brusque decidiu apresentar um projeto para os colegas de classe sobre o cotidiano de uma adolescente com autismo. Julia Erbs, de 13 anos, foi diagnosticada com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e hoje tem a intenção de levar informação para aqueles que não conhecem ou não sabem como conviver com um autista, além de ensinar como evitar uma crise.

A estudante do sétimo ano da Escola de Ensino Fundamental do Paquetá aproveitou o espaço no ambiente escolar para fazer a apresentação. A ideia partiu da própria adolescente que sentiu a necessidade de divulgar informações sobre o TEA com os colegas de classe.

O objetivo dela é mostrar os sinais do espectro, como é a convivência e como uma pessoa autista reage em determinadas situações criadas pelos amigos ou professores no ambiente escolar.

“Ela quer inclusão, ela não quer ver uma criança ou adolescente separado e os outros amiguinhos acharem que ele está ali por opção. Funciona diferente e ela quer mostrar o motivo da criança estar separada, o que leva um adolescente a uma crise e que o barulho dentro da sala de aula é muito prejudicial para um autista que tem sensibilidade”, comenta a mãe Marli Erbs.

Julia desenvolveu o projeto e apresentou em diversas turmas da Escola Paquetá | Foto: Arquivo pessoal

Terapias necessárias

Aos 11 anos, Julia recebeu o diagnóstico de autismo. No entanto, a mãe recorda que desde os 3 anos a menina apresentava sinais. Ela tinha dificuldade para falar, atraso para andar e dificuldade motora. A menina nunca teve bloqueio para interagir, mas ao identificar uma barreira ela prefere ficar no canto dela e tem problemas para se abrir.

“A menina tem muita dificuldade de conseguir o laudo, então acaba se camuflando muito. Independente disso, desde pequena, nós sempre fomos buscando a fonoaudiologia, o balé para o equilíbrio, que ela faz há 10 anos e já melhorou muito, e o inglês para treinar mais a posição da língua”, recorda a mãe.

Marli comenta que apesar da situação financeira da família, ela batalhou para conseguir as terapias necessárias para Julia. Segundo ela, em Brusque é difícil conseguir acesso aos tratamentos, mesmo com o laudo em mãos. Hoje, a mãe comemora ao ouvir a filha falar que tem orgulho de ser autista.

Dança é um dos hiperfocos da Julia | Foto: Escola de Ballet Ana Rockenbach/Divulgação

Autismo não é doença

Apaixonada pela leitura e pela dança, atividades que geram o hiperfoco da jovem, Júlia preparou uma apresentação em slide onde se apresenta para os demais colegas de classe, comenta sobre as terapias que realiza, tópicos importantes como o excesso de barulho, luminosidade, alimentação e as expressões com duplo sentido.

A adolescente explicou que não consegue compreender quando as pessoas se comunicam com o sentido figurado. Frases como “minha vida é um mar de rosas”, “caiu do cavalo” e “morrer de frio”, podem confundir a cabeça de um autista. Por isso, ela compartilhou com os colegas a importância do sentido literal.

Com o apoio da profissional do Atendimento Educacional Especializado (AEE), conhecida como professora dois, a adolescente entendeu que podia conversar sobre o tema em sala, que é onde as crianças desenvolvem a primeira barreira.

Julia também participa da Associação de Pais, Profissionais e Amigos dos Autistas (Ama) de Brusque e tem contato com outros adolescentes e adultos autistas. Ela passou a ver que há possibilidade para realizar os sonhos, como o de ser palestrante ou escritora, e buscar o ensino superior.

Julia pretende levar o projeto para outras escolas do município | Foto: Arquivo pessoal

“Não é o autismo que vai atrapalhar. Ela convive com pessoas graduadas dentro da Ama. A associação tem muita participação na forma que ela passou a ver as coisas, o mundo fora do autismo. Foi maravilhoso pois ela adquiriu muito conhecimento dentro da Ama e ela é uma adolescente que representa nas rodas de conversa por onde a associação vai”, comenta Marli.

Nesses encontros da Ama, Julia já ouviu relatos de outras adolescentes com o espectro que tentaram tirar a própria vida ou que sofrem com depressão. “Ela quer levar isso para as pessoas e mostrar que não é necessário chegar nesse nível, que você pode ter ajuda no meio em que convive”.

Em sala de aula

Após a apresentação para a sala, a escola permitiu que Julia conversasse sobre o tema com as demais turmas. No momento, o principal objetivo de Julia é levar o tema para outras escolas, pois existem muitos autistas que não conseguem ficar na sala de aula. Ela acredita que ao mostrar o impacto que o ambiente causa na pessoa, os colegas vão ajudar e serão participativos.

Depois da conversa, os colegas de classe começaram a entender como Julia se sente ao sofrer bullying ou ser vítima de uma piada. A adolescente também explicou que o barulho alto é um gatilho para ela, e acaba ocasionando uma crise. Com isso, ela não consegue prestar atenção na professora, as ideias ficam desorganizadas e ela perde a linha de raciocínio para fazer a tarefa.

Marli ao lado das filhas Julia, responsável pelo projeto, e Giovana Erbs | Foto: Arquivo pessoal

“Ela desenvolveu uma forma de se comunicar para que todos consigam entender quando ela está entrando em uma crise. Quando começa a ficar muito barulhento e ela começa com as estereotipias de bater a mão e entrar em um grau de ansiedade, ela se levanta. Assim os colegas vão entender que a Julia não está bem e eles diminuem o volume na sala de aula”, explica a mãe.

Anteriormente, quando situações semelhantes aconteciam, a adolescente colocava os dedos no ouvido e era obrigada a sair da sala, caso contrário ela entrava em uma crise e começava a chorar. Hoje a turma aprendeu a ler os sinais e identificar a situação. “Eu me emociono com isso, pois partiu dela. Creio que em Santa Catarina não teve outra adolescente com uma iniciativa dessa dentro da sala de aula”.

De adolescente para adolescente

A jovem luta para que o autista não fique totalmente dependente da professora dois, mas para que ele sinta que faz parte do grupo e que não seja deixado de lado. “Eu sei que ela vai conseguir levar a mensagem dela para o maior número de pessoas possível. Ela quer informar, conscientizar e ajudar. Quando um adolescente fala para outro adolescente é diferente, existe uma conexão maior”.

Para ajudar no equilíbrio, Julia faz balé há 10 anos e hoje apresenta grandes avanços | Foto: Escola de Ballet Ana Rockenbach/Divulgação

Na escola anterior, Julia foi vítima do preconceito por ser autista. Foi através da psicóloga da Ama que ela encontrou uma forma de lidar com isso e exteriorizar os sentimentos. “Ela sofreu bullying principalmente na Educação Física, pois desde pequena ela não corre, ela saltita. Ela tem dificuldade na parte motora para andar em linha reta, subir e descer, por isso ela está no balé há 10 anos. Ela não consegue correr, mas trabalhando essa parte do equilíbrio, ela conseguiu ir para a sapatilha de ponta”.

A aluna já fez a apresentação para outras turmas da escola, que tem 21 autistas diagnosticados, e agora tenta levar o projeto para outros educandários. Julia luta para que o assunto seja debatido durante todo o ano, e não apenas na Semana da Inclusão.

“Se nem os adultos e os pais têm informação, como a gente vai exigir das crianças que falem ou que venham agir de modo diferente se eles não receberam isso em casa ou na sala de aula?”, finaliza Marli.

Julia batalha pela inclusão dos adolescentes e crianças com autismo | Foto: Arquivo pessoal
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