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Um desabafo

Apesar da pandemia, que continua nos cobrando milhares de mortos todos os dias e da crise política que, por ora, estremece os alicerces da República, resolvi voltar-me nesta semana de Páscoa para assuntos menos polêmicos, principalmente para dar uma folga ao meu sofrido lombo, que já não mais aguenta servir de saco de pancada à […]

Apesar da pandemia, que continua nos cobrando milhares de mortos todos os dias e da crise política que, por ora, estremece os alicerces da República, resolvi voltar-me nesta semana de Páscoa para assuntos menos polêmicos, principalmente para dar uma folga ao meu sofrido lombo, que já não mais aguenta servir de saco de pancada à obsessiva clientela bolsonarista local que, ao deparar com minha minúscula foto no alto da coluna, já vê-se acometida de uma aguda crise de azia, normalmente agravada por uma pipocante urticária, que vai brotando durante a leitura de minhas considerações sobre os mandos e desmandos governamentais do venerado Messias no poder.

As linhas que produzo para o jornal já me ensinaram que, para os 30% de brasileiros que continuam seguindo cegamente este presidente em qual não votaram, – pois Bolsonaro renegou praticamente todas as suas promessas de campanha -, a crítica inexiste, e quem ousa questionar a perfeição do mito é catalogado como esquerdopata e petista “fdp”, que não quer o bem do  Brasil.

Vitaminados pela fantasia de Bolsonaro ser o proprietário exclusivo da fórmula para salvar o país, os bolsonaristas da paróquia enxergam na minha coluna um lesa-pátria e passam a me xingar com verdadeira volúpia de esquerdopata, comunista, vermelho, além de me mandar continuamente para Cuba e tomar no c…! preferencialmente nas redes sociais, mas também em restaurantes e supermercados.

Esquecem esses leitores que uma coluna representa única e exclusivamente a opinião de seu autor, naturalmente sem nenhum “Selo de garantia” de verdade absoluta. Adoram esquecer também que, apesar deste momento de extremos, ainda nos encontramos sob um regime democrático, onde o respeito ao pluralismo de ideias continua sendo um dos fundamentos para o exercício das lides democráticas.

Ressalte-se o “ainda”, pois, no momento, as forças da direita estão profundamente envolvidas na tentativa de um golpe de Estado,  para fazer de Bolsonaro um ditador e, nas redes sociais, a máquina propagandística bolsonarista está a todo vapor, tentando convencer a população do iminente golpe comunista, que contaria com as bênçãos dos governadores e prefeitos.

Se porventura ainda estivéssemos sob o regime militar de 1964, estes propagandistas de fake news seriam acusados de subversão e varridos diretamente das redes sociais para os tenebrosos calabouços da ditadura.

Felizmente, ao que tudo indica, as Forças Armadas não estão dispostas a envolver-se em aventuras extraconstitucionais. Que não mudem de ideia.

Vejo o brasileiro médio muito mais politiqueiro do que politizado, manobra fácil para manipulações de qualquer espécie. Normalmente não se informa com seriedade sobre candidaturas políticas e se um jornal cai em suas mãos, vai direto para a coluna social, horóscopo e a página policial. Quem faleceu também interessa.

O Brasil só teria a lucrar se as escolas reintroduzissem no currículo escolar a matéria de “Moral e Cívica”, para ensinar aos jovens que patriotismo não é enrolar-se na bandeira verde amarela e sair buzinando cidade afora, bem como ensinar-lhes o significado de cidadania, democracia, eleições, comunismo, congresso, judiciário, enfim, para que os jovens aprendam a respeitar e cultivar desde cedo os fundamentos da democracia e mostrar-lhes  que, para viver num país justo, cada qual deverá dar sua a sua contribuição.