Sendo geminiana parece muito interessante ter dois gatos ao invés de um. Vivi muitos anos com um gato que era taurino. O Einsten era pura calma. Tranquilo e carinhoso, viveu comigo por 20 anos. Criou asas no dia 07 de setembro do ano passado e foi morar no céu.

Não quis deixar a casa vazia, pois bichos me complementam. E gatos, ah, os gatos me ensinam liberdade, disciplina e percepção de si. Então adotei dois! Uma gatinha, a quem dei o nome de Pietá e um gatinho a quem chamei de Xaplin (com X mesmo).

A casa se transformou em alegria enquanto esses bichanos crescem. E observo a cada dia o quanto eles me representam. Ela, com seus olhos de mar,  é terna, dengosa, quietinha e muito decidida. Ele, com olhos de mel, é o contrário disso, muito inquieto, visceral e apaixonado. Conviver com eles, é estar conectada com meus dois lados. Um, mais feminino, carregado de doçura e ternura.

Ferramentas que me garantem um estar no mundo que me suaviza e me reconcilia com os dissabores. Outro, mais masculino, guerreiro e ativo, onde o gesto é sempre forte e imediato. Nele vejo minha propensão a instabilidade e transformação constante.

Viver com eles é como ver num espelho minha personalidade. Mas esse espelho não é de aparências, mas de algo interno que ninguém, nem eu, vê. No entanto são artimanhas que sei que possuo. Parece, inclusive, que quando a Pietá se aproxima, é quando preciso me acalmar, preciso refletir e ancorar um pouco minha folia interna. Ela vem, se aconchega, me afaga, lambe. Exige que eu pare e me aquiete, senão ela vai embora. É como se ela despertasse em mim, a mãe e a sensibilidade feminina, como armas poderosas para estar no mundo. Então, aceito, e carinhosamente nos aninhamos e deixamos o tempo passar, para a vida ficar mais inteira.

Já, o Xaplin, não se aproxima, ele exige com seus miados irreverentes que eu me movimente. Busca as múltiplas bolinhas de sacos plásticos que faço para ele e, com ela na boca, me segue pela casa cobrando minha atenção, minha ação. Ele quer brincar o tempo todo. Me faz rir de seus ímpetos, e de sua descarada apropriação da casa. Para ele, nada é proibido e tudo, absolutamente tudo, pode ser tocado e envolvido por ele em um brinquedo. Não resisto, e então, mesmo envolvida em pensamentos burlescos e insanos, nas pressas e emergências que insistem em me consumir… paro tudo e brinco com ele. Corro pela casa, me escondo, jogo bola, esmago seu pelo confortável e luto, em uma guerra altiva, com seus músculos potentes. Ele me põe ativa, me faz rever minhas armas, e ao mesmo tempo, me mostra, que não é uma guerra de verdade, mas é uma guerra de descoberta de poder.

Meus gatos me fazem uma pessoa mais inteira. Pois cada um, a seu modo, permitem que eu observe que posso ser ambas as coisas:  terna e visceral.  introspectiva e brincalhona. Posso ser sensível sem ser frágil. E posso ser forte sem ser repressora.

Mesmo eles sendo dois, representam o felino, acredito que no meu gato anterior, essas duas características estavam em um só. E foi ele que me preparou para poder hoje ver, nessas duas criaturinhas deliciosas, o prazer de dar um tempo a mim mesma, para que eu possa não estar refém de paixões ou órfã de carinhos, mas estar inteira e única, conectada com meus estados, mas suficientemente longe deles para que eles não me subjuguem e nem reprimam a pessoa e sujeito que posso ser.


Silvia Teske
– artista