Empresa investigada por fraudes na merenda escolar recebeu mais de R$ 8,8 milhões da Prefeitura de Brusque
Município informa que já suspendeu quaisquer novos pagamentos à BV
Município informa que já suspendeu quaisquer novos pagamentos à BV
A empresa investigada pela Prefeitura de Brusque por fraudes na merenda e na entrega de cestas básicas recebeu quase R$ 9 milhões desde 2015. A informação consta em levantamento inédito realizado por O Município no Portal da Transparência.
O levantamento leva em conta os gatos listados na aba pagamentos dentro do portal. Portanto, tratam-se de dívidas já pagas, diferentemente de empenhos – que são uma espécie de promessa de pagamento. Entretanto, não é possível afirmar que todo o valor foi fraudado, pois só depois de investigação a prefeitura saberá o tamanho das fraudes, se forem comprovadas.
Os dados revelam que a Distribuidora de Alimentos BV recebe da prefeitura desde 2015. Não há informação de pagamentos em anos anteriores feitos a essa mesma empresa.
Há quase cinco anos como fornecedora do município, a investigada recebeu R$ 8,89 milhões na soma dos montantes da Secretaria de Educação e da Secretaria de Assistência Social.
Só em 2019, até o momento a prefeitura pagou R$ 1,1 milhão à BV. Como novos pagamentos estão suspensos, o montante não deve subir, a não ser que haja alguma reviravolta nos processos administrativos abertos para a investigação.
O valor pago no ano passado foi de pouco mais de R$ 2 milhões. Foi um dos anos mais rentáveis para a BV. Perde só para 2016, quando a prefeitura pagou R$ 2,3 milhões.
Embora a suposta fraude tenha sido descoberta na entrega dos produtos da Assistência Social, a maior parte do valor pago à empresa investigada vinha da Educação, no fornecimento de alimentos para a merenda.
De acordo com o levantamento, foram pagos R$ 5,9 milhões à BV para a merenda escolar. Deste total, neste ano foram liquidados R$ 457 mil – é o menor valor desde 2015.
Entre 2015 e 2018, o município pagou anualmente mais de R$ 1 milhão à empresa. O auge foi em 2016, quando a BV recebeu R$ 1,6 milhão da Educação.
A empresa investigada também fornecia cestas básicas para a Prefeitura de Brusque, que as distribui à população mais carente do município. A investigação apontou que há indícios de que alimentos que compunham o sacolão eram trocados por outros mais baratos de qualidade inferior.
Enquanto prestava o serviço, a BV recebeu cerca de R$ 2,7 milhões do município. Este ano vinha sendo um dos mais lucrativos, pois o Portal da Transparência mostra que já haviam sido pagos R$ 676 mil, só R$ 3 mil a menos do que o melhor ano, em 2016.
O diretor-executivo do Observatório Social de Brusque (OSBr), Evandro Gevaerd, diz que o órgão apoia esse tipo de procedimento da prefeitura e enaltece o trabalho ativo da Controladoria, apesar do pouco número de funcionários. “A prefeitura tem agido ativamente, em especial a Controladoria-Geral do Município”.
O OSBr também tem um trabalho de fiscalização da merenda escolar e teve participação na elucidação do caso. O Observatório recebeu uma denúncia, analisou que havia indícios factíveis e enviou o caso à prefeitura, que então tomou as providências.
Os procedimentos administrativos desencadeados pela Prefeitura de Brusque resultaram, também, na demissão de um funcionário comissionado da Secretaria de Assistência Social.
Os dados funcionais do portal revelam que o servidor foi nomeado por indicação em 1 de fevereiro de 2017 e ficou no cargo até 5 de novembro deste ano. Ele era lotado como coordenador, com salário bruto de R$ 4.333,49.
A Procuradoria do município, responsável pela investigação interna, recomendou a demissão do fiscal de contratos por considerar que não havia como ter ocorrido fraude nas cestas básicas sem, no mínimo, a incompetência do servidor.
O relatório da Controladoria-Geral do Município apontou que há indícios de participação do comissionado no caso. De acordo com a investigação, no dia 4 de outubro de 2019, a fornecedora foi até a prefeitura às 5h da madrugada, sendo que expediente só começa às 12h.
A empresa argumentou com o vigilante que se tratava de recolhimento e substituição de cestas com validade vencida. Nesta mesma ocasião, ainda conforme a Controladoria, o comissionado fiscal de contrato também esteve presente de madrugada.
Perguntado depois dos fatos, o então fiscal disse que estava tudo regular e que o depósito não teria sofrido modificações. Entretanto, o controlador e testemunhas verificaram o contrário.
“Da narrativa, resta a presunção de que a empresa fornecedora, agindo com informações privilegiadas e em conluio com agente interno, tentou frustrar o resultado investigativo, substituindo cestas básicas fraudadas e já periciadas/checadas pelo controlador interno, por outras livres de adulterações. Ainda segundo o controlador, a fornecedora somente sagrou-se vencedora do certame por conta de uma falha no processo licitatório”, escreveu o procurador-geral do município, Edson Ristow, em sua decisão.
A reportagem tentou contato com o secretário de Assistência Social, Deivis da Silva, para comentar sobre as suspeitas de irregularidades na pasta comandada por ele, mas não obteve sucesso.
O Município também entrou em contato com os dois telefones atribuídos à BV na Receita Federal. Um deles foi atendido pela contabilidade, que indicou o número da empresa, mas ninguém atendeu.