Bruno da Silva
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A discussão sobre saúde mental está cada vez mais presente em todo o mundo. Por conta da pandemia, os problemas deste tipo aumentaram, mas as pressões do dia a dia, as redes sociais e as crises econômicas e políticas influenciam para uma sociedade mais ansiosa e depressiva.
Apenas no Hospital Azambuja, entre janeiro e abril deste ano, quase 100 pessoas foram internadas por conta de crises relacionadas à saúde mental em leitos do Sistema Único de Saúde (SUS). O número vem aumentando nos últimos tempos – em 2021, foram 243 no total, e, em 2022, 281.
Coordenador do serviço de clínica médica e responsável pelos leitos de saúde mental do Hospital Azambuja, Antônio Lanna explica que as causas de ansiedade, depressão e outros transtornos mentais são de origem multifatorial. Desta forma, não existem soluções mágicas. Para tratar desses problemas, é necessário que o paciente esteja disposto a buscar ajuda e mudar comportamentos.
“A ansiedade é uma doença potencializada pelo contexto social da pessoa, mais ainda do que é biológico. Acaba virando biologia, isso vai virar inflamação de baixo grau, que vai mudar os neurotransmissores, mas não adianta você só tomar o remédio, um ansiolítico. Os problemas não se resolvem”, destaca o médico.
As causas
Os problemas de saúde mental são causados por uma gama diversa de fatores, que são potencializados quando combinados. A pressão exercida pelas redes sociais, por exemplo, é um deles.
“O jeito que as redes são estruturadas potencializam a ansiedade. Junto da ansiedade, a sensação de que a gente também não vale nada. Porque o outro está sempre bem. Você acha que todos seus amigos estão viajando mais que você, se divertindo mais do que você, seus familiares são mais ricos do que você”, exemplifica Lanna.
Além disso, a pandemia exacerbou muito os fatores que causam problemas mentais. “Todo mundo tem medo de que aconteça uma outra pandemia. Tivemos as discussões sobre a vacina, o isolamento. As medidas tomadas foram tomadas para aliviar a sobrecarga, mas a postura de parte da sociedade de achar que estava tudo errado fez com que se gerasse uma grande insegurança, que gera ansiedade. Isso por si só já foi um fator”.
Outro grande impacto da pandemia foi o grande número de mortes: mais de 702 mil pessoas só no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde. Hoje em dia, temos outros tipos de sequelas causadas pela Covid-19.
Junto com a pandemia, vivemos uma crise econômica, momentos de instabilidade política. Na nossa sociedade, estamos sobrevivendo a essas crises, e umas pessoas sentem mais os impactos do que as outras.
“O isolamento, o medo, a desagregação familiar, o aumento dos casos de abuso sexual, do desemprego, a piora das condições socioeconômicas, as mudanças das rotinas de trabalho uma somatória de fatores que faz com que a pandemia seja um divisor de águas para o comportamento humano”, resume o secretário de Saúde de Brusque, Osvaldo Quirino de Souza.
Ele destaca que é alarmante o aumento do número de casos de pessoas em sofrimento no município. “Como administrador público, precisamos estar muito atentos. Com o aumento populacional da cidade, a tendência também é de aumento da demanda”.
Em meio a este turbilhão de pressões que a sociedade impõe, Lanna explica que o paciente com algum tipo de problema de saúde mental não melhora psicologicamente ou psiquiatricamente sem ter uma mudança de contexto social, de atitude e de comportamento.
“É virtualmente impossível, porque a gente precisa fazer aquelas coisas, que parecem conselhos de vó, mas que são essenciais. Beber água, alimentar-se adequadamente, dormir por volta de 7 horas por noite, fazer atividade física todo dia”.
A medicação pode ajudar a diminuir a ansiedade, mas o paciente precisa entender que terá que fazer a reeducação alimentar, fisioterapia, atividade física, ações que têm impacto maior em longo prazo
“É algo que se retroalimenta. Não adianta a gente só tratar do ponto de vista medicamentoso. Tem que encarar o tratamento psiquiátrico mais como um suporte, que pode iniciar uma mudança, do que realmente o tratamento todo em si. Na internação, é muito difícil você ter resultados definitivos, porque os diagnósticos psiquiátricos são desenvolvidos ao longo do tempo. Às vezes a pessoa vem como manifestação de ansiedade, mas pode ser uma doença objetiva”.
Procedimentos
O esforço do acompanhamento médico no Hospital Azambuja é de separar o que é transtorno de saúde mental do que é uma doença orgânica. “Se o paciente tem um infarto, ele vai ter sintomas ansiogênicos, dor no peito, preocupação. A gente separa isso principalmente pela característica dos sintomas, pelo aparecimento e relacionamento com outras coisas”.
O foco da internação é resolver as crises. No seu trabalho de mestrado, Lanna propôs um protocolo de tratamento de crise suicida, que é impactante aqui na nossa região. Neste sentido, a equipe busca resolver a crise. O problema em si, que tem a origem em seu contexto biopsicossocial, não se resolve através apenas de medicamentos.
“Tentamos então iniciar então o trabalho de amparo através do serviço social. Essas pessoas têm papel fundamental em auxiliar no contexto, identificar as fragilidades que a pessoa tem, para a gente tentar diminuir essas dificuldades. Vamos dar o caminho para o paciente, mostrar quais direitos, benefícios que elas podem receber através do governo, quais serviços estão disponíveis no sistema público de saúde. Reforçamos as medidas não farmacológicas, mudanças no estilo de vida”.
Tratamento e reincidência
Depois que o paciente passa pelo momento de crise e recebe alta, o hospital desenvolve um relatório para a continuidade do tratamento.
“Não temos uma estrutura para internação de longa permanência. Internar no hospital é para quem realmente tem problemas mentais muito graves. Só que, para quem não tem esses problemas mentais muito graves, a internação vai falhar, porque ele vai voltar para o contexto onde estava e, se não resolver dentro dele e a abordagem do contexto em que vive, vai voltar para o problema ou para o hospital, o que é muito comum. Temos uma assiduidade dos pacientes com problemas de saúde mental. Depois de algum tempo, ele acaba voltando. Por mais que a gente oriente o que precisa ser mudado, sabemos que não é uma coisa fácil. Temos nossas limitações, mas buscamos entregar para uma visão mais ampliada do problema”.
Para construir um diagnóstico, é necessário juntar todas as peças. É quase como um trabalho de Sherlock Holmes. O paciente vai trazer um sintoma, mas é necessário investigar para saber qual é realmente o problema. O papel do médico, nesses casos, é melhorar a conversa tentando trazer mais elementos.
Neste sentido, Lanna destaca a importância da honestidade na conversa com os médicos, para que não passem despercebidas causas orgânicas.
Além do psiquiatra, ter uma conversa honesta com psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais.
“A ansiedade tem que ser tratada quando ela começar a ter prejuízo na nossa relação. O que a gente tem que buscar é tentar ver realmente como e onde ela está prejudicando e estar preparado para mudar a atitude para poder responder melhor aquela situação. Se tiver problemas no trabalho, então temos que entender como nos adaptar para poder responder melhor ao trabalho e diminuir aquela sobrecarga de ansiedade que a gente tem. mesma coisa em casa, na escola, com os amigos”.
Estrutura para atendimento
Brusque não tem leitos de internação para psiquiatra, mas os leitos de saúde mental são específicos para esse para esses problemas, contando com uma preparação diferente e uma equipe destinada diferente.
No município, existem três unidades especializadas em tratamento de saúde mental, o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), o Centro de Atenção Psicossocial II (Caps II), que atende pacientes com problemas emocionais e de saúde mental, e o Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (Capsi), além do Serviço de Atenção Integral as Pessoas em Situação de Violência Sexual (Savs), que serve como apoio para casos específicos.
Além disso, a rede de saúde tem quatro psiquiatras e cinco psicólogos. O secretário de Saúde, Osvaldo Quirino, destaca que há um esforço para melhorar os protocolos, já que as estruturas estão sobrecarregadas. Apenas entre janeiro e abril, as três unidades do Caps realizaram mais de 37 mil atendimentos.
“Estamos destacando um psiquiatra para fazer a capacitação dos médicos generalistas nas UBSs para acelerar o fluxo. Muitas vezes, demora para o paciente ser atendido pelo psiquiatra. Temos também em mente a criação de um Plano de Valorização da Vida, que está em estruturação, para atender pessoas em sofrimento e/ou que tentaram suicídio. Há uma lacuna grande. As pessoas que tentam suicídio, na maioria dos casos, avisam meses antes de sua intenção. Até por isso, vemos a importância da intervenção”.
De acordo com Lanna, a rede de atenção psicossocial é essencial para o tratamento desses pacientes em longo prazo.
“A gente interna muito mais do que a gente deveria por causa da sensação da população de que está desassistida por não ter o número de psiquiatras que eles gostariam. É muito comum, por exemplo, o paciente ir no serviço, não conseguir atendimento com o psiquiatra e ir para o hospital. Existem vários profissionais que podem auxiliar a diminuir a ansiedade”, explica.
“A gente tem esse serviço de porta aberta, a gente tem um hospital que é 24 horas, sete dias por semana, temos essa função e essa característica de ser realmente uma casa aberta para ajudar a comunidade, mas a gente tem os Caps, as UBSs e outros serviços para receber essas pessoas”, completa.