José Francisco dos Santos

Mestre e doutor em Filosofia pela PUC/SP, é professor na Faculdade São Luiz e Unifebe, em Brusque e Faculdade Sinergia, em Navegantes/SC e funcionário do TJSC, lotado no Forum de Itajaí/SC.

Coragem para ser feliz

José Francisco dos Santos

Mestre e doutor em Filosofia pela PUC/SP, é professor na Faculdade São Luiz e Unifebe, em Brusque e Faculdade Sinergia, em Navegantes/SC e funcionário do TJSC, lotado no Forum de Itajaí/SC.

Coragem para ser feliz

José Francisco dos Santos

Segundo a escritora Clarice Linspector, ser feliz é uma grande responsabilidade e poucas pessoas têm a coragem de assumí-la. A ideia é aparentemente estranha, uma vez que a felicidade é, ao menos teoricamente, o bem a que almejamos por excelência.

Mas a estranheza desaparece se considerarmos que a felicidade não é algo que simplesmente “acontece” na nossa vida, como um lance de sorte. Se as condições para a felicidade não estão presentes, tendemos a ficar sonhando o quanto seríamos felizes se as coisas fossem diferentes.

Mas a ideia de que ser feliz implica coragem nos faz reavaliar a situação. Parece que o que Linspector quer dizer é que a felicidade não depende, de saída, do que é externo a nós. Aliás, pessoas que vivem com todo o conforto, facilidades ou condições que gostaríamos de ter para sermos felizes, não necessariamente o são. Encontrei no psicólogo norteamericano Rollo May algumas possíveis respostas.

Em seu livro “O homem à procura de si mesmo”, May fala de certa “luta para ser”, que caracteriza o processo de todo indivíduo para diferenciar-se da massa, emergir, adquirir a autoconsciência, tomar decisões livres. Esse é um processo que leva toda a vida.
Está aí uma tarefa para gente realmente corajosa.

Diferenciar-se da massa é tão necessário quanto angustiante. São muitos os fatores que nos impedem de cortar o cordão umbilical, deixar de ser dependente demais, assumir a própria vida. Isso não quer dizer que devamos abandonar as pessoas que nos são caras. Não precisamos virar “hippies” e sair na estrada com uma mochila nas costas, como na imagem emblemática da década de 1970.

Mas, em algum momento da vida, precisamos nos dar conta de que somos responsáveis por nós mesmos, que ninguém poderá fazer nossas escolhas, ninguém poderá viver as consequências daquilo que decidimos. O primeiro passo para ser feliz deve ser, então, essa coragem de assumir a própria individualidade, aceitar-se, sentir-se responsável por si e comprometer-se com a própria felicidade.

Em muitos casos, a dependência excessiva da família atrasa demais esse processo e, por melhor que seja a família, ela não poderá viver a vida individual de cada um. Devem permanecer os laços afetivos, os valores, o respeito, mas ninguém consegue viver eternamente numa infância afetiva e moral, dependente dos cuidados e das decisões dos outros.

Quando o suporte familiar não anima o sujeito a permanecer no casulo, é comum que transfira essa dependência para outras pessoas ou situações. Dessas situações, as mais comuns são os vícios, pois eles são a busca da segurança e da autoafirmação em algo externo, que promete o que absolutamente não pode cumprir. Ao entorpecer a consciência, o indivíduo perde o contato com aquilo que poderia fazê-lo enfrentar a vida e ser feliz. E como a felicidade vem sendo confundida com esse entorpecimento!

Por vezes, o próprio sofrimento se torna uma espécie de “muleta”, que se usa para evitar a luta pela felicidade. Não que o sofrimento seja desejável, mas vejam como algumas pessoas têm um prazer secreto em expor sua ladainha de dores e decepções, quase como quem exibe um troféu. Tem coragem quem consegue tomar o sofrimento que não se pode evitar e transformá-lo em luta pela própria realização como pessoa. Ninguém encarna melhor esse ideal que Dona Lilli Zwetsch Steffens, cuja história está registra no livro “Nas mãos de Deus”, escrito por ela em parceria com Saulo Adami. Difícil encontrar melhor exemplo dessa coragem de que fala Clarice Linspector.

A felicidade se esconde quando aceitamos o que é cômodo e preferimos nos moldar aos compromissos, às convenções, àquilo que não brota do nosso interior. Isso custa a autenticidade, o brilho, coisas que só poderemos experimentar se tivermos coragem para enfrentar o desafio de traçarmos nossa própria rota e vivermos com responsabilidade as consequências das nossas escolhas.

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