Na história da humanidade, não são raros os momentos em que os olhos da população são desviados de situações reais por manobras utilizadas para escondê-las por meio de “cortinas” que, ao atuarem no imaginário coletivo, desviam a atenção daquilo que realmente nos deveria importar.
Nesse exercício de ilusionismos, como em um show de mágica, nossos olhares são levados aos pontos de interesse do habilidoso feiticeiro, para que seu truque não seja descoberto.
Para essa ambição – do controle dos olhares, poucas estratégias se mostram mais eficazes do que o uso indiscriminado de termos indeterminados. O que significa um termo indeterminado? Ora, palavras que são subjetivas por natureza, que possuem uma moral embutida, que pretendem estabelecer julgamentos de valor iniciais para qualquer tentativa de conversa. Aqui, incluímos palavras como “bons costumes”, “justiça”, “ética e moral”, observando nelas uma tentativa de controle das opiniões pela tática da imposição desses termos.
E o problema aqui não está na justiça, ou nos bons costumes em si, naturalmente, mas no fato de que estes são conceitos absolutamente abstratos, subjetivos, indeterminados, que a grande maioria das pessoas repete sem nunca ter parado um segundo sequer para refletir sobre o que eles realmente significam.
Como um pai arrependido, a humanidade sempre que se depara com violências praticadas contra a raça humana – que deveria ser justamente o ponto para o qual nossos olhos focam-se. Por exemplo, nos casos das grandes guerras, quando olhamos para trás e nos perguntamos: “Aonde foi que a humanidade errou?”.
Não raras vezes a resposta para essa pergunta se encontra no fato de que, em algum momento, aceitou-se a relativização de direitos humanos individuais e fundamentais, geralmente em nome de algum termo indeterminado. Foi essa uma das principais estratégias em cenários como o da Alemanha de Hitler, ou das ditaduras militares da América Latina.
Nenhum regime autoritário assume o poder sem o apoio do povo. E nenhum povo aceita se sujeitar a essa situação se não por meio da manipulação da opinião pública. Do contrário, por que um povo aplaudiria a retirada dos direitos individuais de seus coabitantes? Observando pela própria ótica de “bons costumes” e “boa moral”: quem concordaria com o extermínio em massa de seres humanos ou com a abolição em massa dos direitos individuais?
Jürgen Habermas, sociólogo alemão, já advertia: a publicidade não é feita em vão, largada a própria sorte, mas dirigida a um destinatário, que preenche as expectativas de comportamento com elas colocadas. Em situações extremistas ou totalitárias, observamos que a massa caracteriza-se pelo comportamento emocional facilmente manipulável, formando sentimentos coletivos, mas não uma opinião pública pautada no pensamento crítico.
E é essa opinião pública, formada em grande parte pelo estímulo persuasivo de quem detém o poder de informação, que legitima situações de ilusão generalizada. Porém, como qualquer cortina, em algum momento esta se abre, desnudando o real objetivo da manipulação social, ainda que para tanto seja necessária que se alcance uma situação gravíssima, por vezes irreversível.
Em uma época em que a revolução digital tornou muito mais acessível a informação – ao contrário de épocas em que toda a comunicação se concentrava na mão do Estado como instrumento de poder – o indivíduo tem a escolha de consumir a publicidade da forma que lhe é imposta, ou refletir verdadeiramente sobre esta, extraindo assim o seu próprio juízo.
Na foto acima, por exemplo, de qual lado da cortina você gostaria de estar: da manipulação pela homogeneidade ou da transformação pela diferença? Aplicar a terminologia reversa, ou seja, abolir os termos indeterminados como julgamento de valor e possibilitar um debate mais livre e pautado nos direitos humanos, ainda se prova um alargamento do que chamamos de democracia – essa sim, que deveria ser a base do que chamamos de imaginário coletivo.