Por volta das 20h30 de uma terça-feira, 24 de março, havia um alvoroço nos corredores da Câmara de Brusque, que estava em sessão ordinária. Comentava-se o fato de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), minutos atrás, decidira pela cassação do mandato do então prefeito Paulo Eccel e seu vice, Evandro de Farias.
No plenário, a sessão era comandada por Roberto Prudêncio Neto (PSD), que havia sido eleito presidente da Câmara meses antes, em uma coalizão de nove dos 15 votos. Ali, ele era informado por André Rezini (PPS) de que iria assumir o cargo máximo do poder Executivo.
No TSE, o julgamento continuava, mas já ninguém prestava atenção, pois a cassação era já irreversível. A sessão foi suspensa temporariamente devido ao alvoroço.
Nesse intervalo, Prudêncio foi comunicado pela assessoria jurídica que dali poucas horas assumiria a prefeitura. Um exagero, já que, por necessidade dos trâmites legais, isso ocorreu em 31 de março.
“Eu me lembro que foi uma sensação muito boa, me senti orgulhoso de poder assumir esse cargo, esperava terminar o mandato”, relata o ex-prefeito, que permaneceu por um ano e quatro meses no cargo.
Daquele dia em diante, sua missão era montar um governo provisório e convocar uma nova eleição em 30 dias, que acabaram se tornando 420, tendo em vista a demora do TSE em julgar o recurso proposto por Eccel.
A partir de quarta-feira pós cassação, o então presidente da Câmara isolou-se na sua residência, local que foi o bunker para que ele, na companhia estrita do pai, o ex-desembargador Carlos Prudêncio, definisse uma nominata de secretários.
Perfil
Roberto Pedro Prudêncio Neto
Idade: 36 anos
Profissão: advogado
Partido: PSD
Mandato: 31 de março de 2015 a 5 de junho de 2016
Foram três dias inteiros sem deixar a residência, lembra Roberto Prudêncio Neto.
“Não sabia se ia ficar 30 dias, seis meses, um ano. Montamos um governo para ficar 30 dias. Não é fácil tirar as pessoas dos seus afazeres para assumir um posto tão importante não sabendo o quanto iam permanecer”.
Nessa entrevista, concedida quase um ano e meio após ele deixar a cadeira de prefeito, ele fala sobre os seus principais momentos no cargo máximo da prefeitura, o qual ele assumiu pela via indireta e, por ironia do destino, também teve que deixá-lo pela via indireta, após perder uma eleição na Câmara para Bóca Cunha (PP).
Depois de deixar a prefeitura e encerrar seu mandato como vereador, ele retomou à advocacia e continua filiado ao PSD, partido do qual é vice-presidente.
Macrodrenagem e situação financeira da prefeitura
Questionado sobre o que considera tenha sido a melhor herança deixada pelo seu mandato interino, Prudêncio destaca duas questões: a saúde financeira da prefeitura e a obra de macrodrenagem no Centro.
Logo no início do mandato, ele editou um decreto de contingenciamento de custos que reduziu salários do primeiro escalão, cortou gratificações e horas extras.
Ele afirma ter herdado um déficit de R$ 9,5 milhões nas contas, o qual conseguiu sanar com essas medidas, entre outras.
Sobre a macrodrenagem, destacou o fato de terem sido feitas de forma bastante rápida, eliminando os efeitos das enxurradas no Centro da cidade, no trecho próximo à praça Barão de Schneeburg.
Lamenta, porém, o fato de que governos que o sucederam não levaram adiante seu procedimento de manifestação de interesse para receber projetos para iniciar a implantação da coleta de esgoto sanitário em Brusque.
“Eu tenho até vergonha de dizer que não temos tratamento de esgoto, e a gente não está vendo nada acontecer”.
Demissão em massa dos comissionados
Oito meses após assumir o cargo, Roberto Prudêncio Neto tomou uma das medidas mais polêmicas da administração pública nos últimos anos: de uma só vez, todos os comissionados da prefeitura foram exonerados, em janeiro de 2016. A atitude, seis meses mais tarde, lhe custaria o cargo, como se verá mais adiante.
A decisão, ele explica, foi unilateral. Questionado se encontrou resistência dos aliados, disse que não houve tempo para isso.
“Não encontrei resistência pois não ventilei [a ideia] para ninguém, não avisei ninguém, chamei o secretario de finanças e o diretor do RH e fiz uma determinação. Foi uma canetada, e dali a notícia se espalhou. Não tomei o cuidado de ligar para ninguém, nem de perguntar, nem nada”, explica o ex-prefeito.
De fato, os secretários foram pegos de surpresa: um comunicado foi enviado pelo secretário de governo, Leônidas Pereira, por Whatsapp, para informá-los da demissão.
Alguns, porém, ainda não tinham lido a mensagem no aplicativo e, quando receberam a ligação da reportagem de O Município, deixaram transparecer sua perplexidade com a medida.
Prudêncio conta porque não informou sua base previamente. “Porque muitos poderiam desencorajar na época. Era uma medida necessária, deu certo e deu resultado”. A medida foi tão unusual que, mais tarde, prefeitos lhe telefonaram para saber dos efeitos, diz Prudêncio.
O esfarelamento da base aliada
“O que eu aprendi na pele: a gente governou para a cidade, e com isso, posso afirmar agora, descontentou outras pessoas, com certeza vereadores, partidos e agentes políticos”.
Prudêncio afirma, com essa frase, que faltou-lhe tato para amarrar acordos políticos, assim como para escolher as pessoas com quem firmar esses acordos.
“Vereadores que ficaram descontentes porque não conseguiram abocanhar tudo o que queriam, trairagens que aconteceram no caminho, partidos políticos que ficaram de fora da prefeitura. A gente viveu um período que a gente não estava com a base sólida”, diz.
Porém, na primeira eleição indireta – convocada para que os vereadores definissem o prefeito definitivo, ainda em 2015 – , ele estava para vencer o candidato rival, o empresário Ingo Fischer, do PP, o qual, sabedor da derrota iminente, retirou sua candidatura.
Nove vereadores integraram a base do nosso governo com indicações e voz ativa lá dentro. Infelizmente não estavam contentes e gostariam de abonhacar mais, por isso fizeram um novo acordo com Bóca Cunha, para abocanhar mais
Até então, a base mantinha-se relativamente firme. Porém, o episódio da demissão dos comissionados a foi esfarelando, entre janeiro e junho de 2016.
Em meados de abril de 2016, após ter sido mantida a cassação de Eccel em julgamento de recursos pelo TSE, finalmente foi convocada nova eleição. Nessa época, a base de Prudêncio na Câmara, que começou em nove vereadores, estava reduzida, ele não tinha mais a maioria.
José Luiz Cunha, o Bóca, então substituiu a candidatura desistente de Ingo Fischer pelo PP, em uma manobra que foi contestada, mas não derrubada, nos tribunais, pois já havia passado o prazo para troca do candidato.
Bóca, abertamente, disse, após ser eleito, que só concorreu porque não gostou de ter sido demitido por Whatsapp. Ele havia sido secretário de Turismo no governo Prudêncio, indicado pelo PP.
“É um desrespeito com a sociedade, ele manchou o nome dele na história, faltou caráter, faltou hombridade. Uma pessoa que já está aí em fim de carreira, ele deu um golpe na cidade. Queria dar o troco, queria se vingar. Ele não se vingou de mim, foi da cidade de Brusque”, afirma Prudêncio.
O “golpe”, porém, segundo ele foi articulado por mais pessoas, incluindo o presidente da Câmara, Jean Pirola (PP). Prudêncio não se conforma, ainda, com os vereadores que eram da sua base e votaram em Bóca na eleição indireta.
“Foram traições, pessoas que não honraram com seus compromissos. Nove vereadores integraram a base do nosso governo com indicações e voz ativa lá dentro. Infelizmente não estavam contentes e gostariam de abonhacar mais, por isso fizeram um novo acordo com Bóca Cunha, para abocanhar mais”. diz.
A opção por ser vice em 2016
Prudêncio surpreendeu na eleição do ano passado tendo sido indicado como vice do empresário Jadir Pedrini (PROS), até então um desconhecido da cena política.
“Foi uma linha nova, uma cara nova para a cidade de Brusque, foi um acordo que nós fizemos. Hoje a gente viu que não foi o que a população gostaria”, avalia.
“Muitos me disseram que eu deveria ter sido o candidato a prefeito, mas são experiências que a gente passa na vida. Não podemos dizer o que aconteceria se fosse invertida a chapa. Já passou agora temos que pensar na outra eleição”, diz.
“Ele está pecando no comando”
Roberto Prudêncio Neto, enquanto vereador, foi o autor do projeto de lei para concessão do título de cidadão honorário de Brusque ao prefeito Jonas Paegle, alguns anos atrás.
Não poupa, entretanto, críticas à sua gestão.
“Tenho certeza que ele tem boas intenções para a cidade de Brusque, eles passaram um período bem turbulento no começo. Mas já estamos finalizando o ano e estou sentindo a cidade sem planejamento”, afirma.
Está faltando e ele [Paegle] está pecando no comando. Prefeito tem que ter o comando na mão, quem tem que governar a cidade é o prefeito e o vice
“Está faltando e ele está pecando no comando. Prefeito tem que ter o comando na mão, quem tem que governar a cidade é o prefeito e o vice”.
Para ele, está faltando também sintonia dentro das secretarias, que “não estão se falando bem”.
“Está faltando diálogo com a população e com as lideranças. O PSD até hoje não foi chamado para conversar, a sua executiva não sentou com o prefeito pra ver quais são suas ideias”.